Abelhas nativas e sua importância para a Conservação


O mel que Pedro Alvares Cabral comeu em abril de 1500, deveria ser da uruçu. Porém, a grande vantagem dos meliponínios brasileiros não é a produção de mel nem de pólen, e sim a polinização das nossas fanerógamas. De 30% das espécies da caatinga e pantanal, até 90% em algumas manchas da Mata Atlântica e algumas partes da Amazônia, as plantas necessitam dos meliponínios para a polinização e frutificação.

do livro "Aspectos pouco mencionados da biodiversidade amazônica"
WARWICK ESTEVAM KERR et all

Da página 316 do Livro de Espécies Ameaçadas (disponível para download em http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=publicacao.publicacoesPorSecretaria&idEstrutura=146&pag=3)

"Entre aproximadamente 3.000 espécies de abelhas existentes (Silveira et al., 2002), três são consideradas ameaçadas de extinção no Brasil. Na realidade, esse pequeno número de espécies ameaçadas (em torno de 0,1% do total estimado de espécies) talvez reflita apenas a nossa falta de conhecimento sobre o estado de conservação das espécies desses grupos. No caso das abelhas, por exemplo, outras espécies indicadas para a lista de espécies ameaçadas deixaram de ser incluídas, dada a falta de informações, qualificando-se na categoria Deficientes em Dados (DD). Some-se a isso as dificuldades oriundas do desconhecimento taxonômico. Por exemplo, nos mesmos ambientes em que vivem as espécies de abelhas consideradas ameaçadas, muitas não podem ser identificadas e, portanto, não podem sequer ser consideradas nas avaliações de risco. É provável que várias delas sejam endêmicas desses ambientes ameaçados. De toda forma, qualquer ação de conservação voltada para as espécies incluídas na lista muito certamente irá beneficiar, também, outras espécies no mesmo ambiente.

É importante ressaltar, ainda, que estamos nos restringindo a dois grupos de himenópteros que, embora importantes, representam uma parcela relativamente pequena da diversidade da ordem. Assim, enquanto abelhas e formigas contribuem com cerca de 12% das espécies de Hymenoptera, os insetos das superfamílias Ichneumonoidea e Chalcidoidea representam, juntos, cerca de 40% da diversidade desta ordem (Gaston, 1991). Isso sugere que o estado de conservação de cerca de 20.000 espécies dessas duas superfamílias, importantíssimas por sua ação como predadores ou parasitóides de outros artrópodes, estejam sendo ignoradas nas avaliações de risco para a fauna brasileira. Como ocorre para os demais insetos, poucas são as fontes de ameaça que podem ser avaliadas objetivamente, quando se considera o estado de conservação dos himenópteros. Uma delas, de importância universal, é a destruição de habitats.

As abelhas chamadas de “indígenas sem ferrão” têm, também, seus ninhos destruídos para exploração predatória do mel. É importante ressaltar que a redução de hábitat e a conseqüente diminuição das populações locais podem criar para as abelhas, além dos problemas reconhecidos para outros organismos, um problema adicional. Isso se deve ao mecanismo de determinação do sexo nesses insetos. Segundo Kerr et al. (1996), a endogamia pode levar à produção crescente de machos diplóides
em lugar de operárias, causando o enfraquecimento das colônias e sua eventual extinção. É possível que tais problemas ocorram, também, em outros himenópteros.

A principal medida de conservação recomendada para os himenópteros é a conservação de seus habitats, o que possibilita a conservação simultânea de locais de nidificação e fontes de alimento em um ambiente propício ao desenvolvimento de suas atividades normais."


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Superinteressante...

Biologia da Polinização: interações
entre as abelhas (Hym., Apoidea) e as flores
de Vassobia breviflora (Solanaceae)

HILDA MASSAKO TAURA & SEBASTIÃO LAROCA
Departamento de Zoologia, SCB, Universidade Federal do Paraná

As interações contemporâneas entre as plantas com flores (Angiospermae) e seus polinizadores são interpretadas como sendo o resultado de uma longa e íntima relação coevolucionária (BAKER & HURD, 1968; PRICE, 1975; CREPET, 1983). Os fósseis mais antigos de angiospermas indicam o seu surgimento no Cretáceo Inferior, há cerca de 130 milhões de anos (BAKER & HURD, 1968; KNOLL, 1986; RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001). O aparecimento e a diversificação rápida das angiospermas levaram a uma dominância crescente no mundo durante o Cretáceo Superior (100-65 milhões de anos atrás) e há aproximadamente 90 milhões de anos, várias das ordens e famílias de angiospermas, existentes atualmente, já haviam aparecido e atingido dominância em todo o Hemisfério Norte, sendo que nos dez milhões de anos seguintes elas atingiram dominância também no Hemisfério Sul (RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001).

Segundo BAKER & HURD (1968) e KNOLL (1986), a diversificação das angiospermas coincide com um aumento pronunciado na diversidade dos grupos de insetos, cuja ecologia está intimamente relacionada à dessas plantas, especialmente Coleoptera, Lepidoptera, Hymenoptera e Diptera. VAN DER PIJL (1960, 1961) acredita que as primeiras angiospermas eram polinizadas por insetos, mais do que pela ação do vento.

Atualmente, existem cerca de 250.000 espécies de angiospermas e uma grande parcela destas, depende de insetos para a polinização de suas flores e conseqüentemente para sua reprodução (WILSON, 1994; RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001).

A fecundação cruzada nas angiospermas é promovida pela dioicia, condição na qual flores carpeladas e estaminadas ocorrem em indivíduos diferentes, e também pela monoicia, onde flores carpeladas e estaminadas ocorrem separadamente na mesma planta. A fecundação cruzada é também promovida pela dicogamia, onde os estames e os carpelos de uma flor maturam em diferentes momentos, ou simplesmente pela separação física dessas estruturas reprodutivas dentro da flor. A auto-incompatibilidade genética, que ocorre amplamente nas angiospermas, torna a autopolinização impossível mesmo que os estames e os estigmas maturem num mesmo momento e entrem em contato entre si. Desta forma, as angiospermas desenvolveram um conjunto de características que atraem uma grande variedade de animais polinizadores — principalmente insetos — que asseguram um alto grau de polinizações cruzadas e desenvolvimento evolutivo (RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001).

Os Apoidea, quer sejam espécies solitárias como sociais, são geralmente considerados o grupo mais importante de insetos polinizadores (BAKER & HURD, 1968; FAEGRI & VAN DER PIJL, 1979).

As famílias modernas de abelhas existem há pelo menos 80 milhões de anos, tendo sua diversificação ocorrido juntamente com a irradiação evolutiva das angiospermas (RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001). Todavia, MICHENER (1979) argumenta que não se observa uma estreita correlação entre o número de espécies de abelhas em uma área e o número de espécies de angiospermas, embora floras e faunas de abelhas não sejam independentes umas das outras.

As abelhas dependem de flores, principalmente como recursos de néctar e pólen, para a sua alimentação e também como provisão para as suas crias. São variáveis no que se refere ao grau de especialização para o forrageamento (LAROCA, MICHENER & HOFMEISTER, 1989). Por exemplo, determinadas abelhas (espécies poliléticas) buscam o pólen, em uma ampla variedade de plantas, enquanto outras (espécies oligoléticas) obtêm o pólen de apenas uma espécie ou então de um grupo de plantas morfologicamente similares ou botanicamente relacionadas (LINSLEY, 1958).

MICHENER (1979) faz uma distinção mais detalhada quanto ao hábito das abelhas em coletar pólen de flores. Assim, as chamadas “amplamente poliléticas” são as que visitam variadas espécies de plantas para tal finalidade, as espécies “estreitamente poliléticas” obtêm o pólen de algumas espécies de plantas não necessariamente da mesma família ou gênero, enquanto que as “oligoléticas” ou “monoléticas” restringem a coleta de pólen a poucas espécies vegetais, geralmente do mesmo gênero ou mesmo de uma única espécie.

As espécies de abelhas oligoléticas, segundo MICHENER (1979), apresentam a distribuição limitada de acordo com a das plantas das quais se alimentam. Porém, a distribuição das espécies de plantas nem sempre são restritas pela ocorrência de abelhas polinizadoras oligoléticas, podendo ser, na ausência destas, polinizadas pelas espécies poliléticas. Ainda, algumas espécies oligoléticas são consideradas como agentes polinizadores não significativos, exercendo na realidade, o papel de parasitas ou predadores de pólen.

Por outro lado, determinadas espécies de abelhas solitárias apresentam atividade de vôo por um breve período a cada ano, durante o qual obtêm néctar e pólen de uma ou de poucas espécies vegetais, sendo que muitas destas abelhas são completamente especializadas (FEINSINGER, 1983; RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001).

Observam-se também nas abelhas, diversas adaptações para a aquisição, manipulação e transporte do pólen para o seu ninho, as quais podem ser etológicas, fisiológicas ou estruturais (THORP, 1979).

Comunidades de abelhas e plantas com flores são consideradas sistemas dinâmicos onde ocorrem interações do tipo mutualismo e competição (PRICE, 1975; WESTERKAMP, 2004). As espécies que participam de interações mutualísticas altamente específicas freqüentemente possuem adaptações estreitamente relacionadas umas com as outras. Por exemplo, isto pode ser observado através da interação entre machos de Euglossinae e orquídeas, sendo que cada uma destas espécies é considerada altamente específica, atraindo uma ou poucas espécies de abelhas (DRESSLER, 1967; RAVEN, EVERT & EICHHORN, 2001); o comportamento de Scaura latitarsis para coleta de pólen de Amaranthus spinosus (Amaranthaceae) e Piper gaudichaudianum (Piperaceae) (LAROCA & LAUER, 1973); da adaptação dos palpos labiais de Niltonia virgilii (Apoidea, Colletidae) para coleta de néctar em flores de Jacaranda puberula (Bignoniaceae) (LAROCA & ALMEIDA, 1985), ou das pernas anteriores de fêmeas de Rediviva (Apoidea, Melittidae) para a extração de óleo do esporão floral de Diascia (Scrophulariaceae) (VOGEL & MICHENER, 1985; STAINER & WHITEHEAD, 1990).

Estudos com enfoque qualitativo e quantitativo são, portanto, necessários para melhor conhecimento do hábito de forrageamento de abelhas, isto é, quais espécies são especialistas ou generalistas na exploração de recursos florais.

Disponível em http://www.abelhanativa.com.br/artigos/

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